Portal da Cidade Registro

Direito

A Cultura do “Cancelamento” nas Redes Sociais e os Direitos da Personalidade

O linchamento público que o “cancelamento” e discurso de ódio promovem impacta diretamente nos Direitos da Personalidade da pessoa física ou jurídica

Publicado em 08/04/2022 às 08:48
Atualizado em

Durante o ano de 2021 vimos no famoso programa televisivo Big Brother Brasil a cantora Karol Conká sofrer aquilo que se chama “cancelamento”, que nada mais é que uma forma de exclusão de alguém, um grupo ou marca após terem atitudes consideradas erradas. Assim, o “cancelamento” pode atingir figura pública, marcas famosas ou mesmo pessoas comuns.

Não se busca aqui apontar o “certo ou errado” sobre as condutas da cantora, e sim lançar o nosso olhar pelo víes jurídico deste fenômeno social crescente na internet.

Como tal, o “cancelamento” gera inúmeras consequências para a vida do “cancelado” que ultrapassam e muito o fato de perder prestígio por meio de seguidores ou likes em suas redes, podendo o excluído sofrer também na esfera financeira, moral, além de considerável abalo familiar, afetivo e psicológico grave – estes no caso somente de pessoa física.

É sabido que “cancelados” passaram a sofrer ameaças de agressão física e até de morte ao andarem nas ruas e frequentarem lugares que lhes eram comuns, e outros que perderam empregos, contratos e tiveram que mudar de país. Há ainda os que foram deixados por seus cônjuges em razão da repercussão que o fenômeno causou em sua vida.

E neste cenário... onde está o Direito?

O linchamento público que o “cancelamento” e discurso de ódio promovem impacta diretamente nos Direitos da Personalidade da pessoa física ou jurídica atingida, direitos estes que resguardam atributos como a moral, intimidade, vida, privacidade, honra, imagem, bem como o nome, a reputação, marca, os símbolos, a identidade, o sigilo, entre outros.

A personalidade é a aptidão de alguém para ser titular de direitos e obrigações no meio social e é composta por elementos que fundam a própria existência da pessoa, sendo por isso intransmissível, indisponível e irrenunciável, conforme o art. 11 do Código Civil. Por seu aspecto existencial, a personalidade está sob o manto da Dignidade da Pessoa humana - Princípio da nossa República inscrito no art. 1º, inc. III, da Constituição Federal, além de obter proteção como Direito e Garantia Fundamental no famigerado art. 5º, inc. X também da Constituição de 1988.

Por outro lado, também como Direito e Garantia Fundamental previsto no art. 5º, inc. IV da referida Constituição, está a livre manifestação de pensamento, que por sua vez autoriza as pessoas dentro de sua esfera de direitos a dizerem o que pensam e agirem de acordo. Ocorre que este preceito constitucional não é ilimitado e absoluto, logo o seu abuso pode dar azo a crimes como o de ameaça, incitação ao crime e contra a honra - só para mencionar os mais vistos.

Como se vê, a depender de como ocorrer o “cancelamento” poderá atingir a vida do “cancelado” de forma extremamente negativa e anormal, ferindo frontalmente os Direitos da Personalidade, momento este em que deixa de ser mera manifestação do pensamento e pode entrar no campo do abuso de direito com reflexos civis e penais.

Reflitamos!

*Vídeo recomendado:

https://www.youtube.com/watch?v=1A5nPUay0Nc Programa Linhas Cruzadas exibido em 04.02.201 pela Tv Cultura. Luiz Felipe Pondé e Thaís Oyama falam sobre assuntos que tocam a sociedade.


* Laura Moreira Tutino Pinto Santos - Advogada inscrita na OAB/SP sob o número 231. 619. Formada pela Faculdade de Direito da Universidade Paulista (Campus de Santos). Especialista em Direito Civil e Empresarial pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná – PUCPR. Especialista em Direito Público pela Escola Superior do Ministério Público do Estado de São Paulo – ESMP SP. Especialista em Direito Processual Civil pela Faculdade de Direito Damásio de Jesus – FDDJ.


Contato: laura@dominguesesantos.adv.br

               https://dominguesesantos.adv.br


Fonte:

Deixe seu comentário