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Carnaval, Cultura Popular e Economia Criativa: alegria, emprego e renda

O mais recente estudo da Fundação Getúlio Vargas (FGV) demonstra que para cada R$ 1 investido no Carnaval, tem-se R$ 13 de retorno

Publicado em 21/02/2020 às 22:01
Atualizado em

Jefferson Pecori (Foto: Divulgação )

O Carnaval assumiu, há quase 100 anos, o protagonismo como maior festa popular brasileira. Evidentemente, isso não se deve somente à capacidade das classes marginalizadas de imprimir suas marcas populares à esta festa, mas também devido à apropriação do carnaval pela indústria cultural. Pois então, é nesta contradição (que se tornou diálogo) que reside as possibilidades de fortalecimento dos elementos populares e da compreensão do Carnaval, a partir da ideia de indústria cultural, como capacidade única de criação de emprego e geração de renda. 

Aberta alas ao diálogo (à dialética), percebemos que, se há, por um lado a apropriação de vários elementos populares do Carnaval pela indústria cultural, também há, por outro lado, a confirmação do Carnaval, como aspecto central da cultura popular brasileira, com referência à nossa matriz civilizacional africana - especialmente o samba -, cuja representação contemporânea são as classes trabalhadoras das periferias brasileiras. De todo jeito, se firmou no Carnaval a esperança de alegria e, a contradição da apropriação do Carnaval pela indústria cultural, permite (ou pelo menos deveria permitir) ao poder público comprometido com a melhoria de vida de sua população, pensar nessa festa como uma enorme oportunidade para o desenvolvimento sustentável local.  

Do ponto de vista da geração de emprego e renda, o mais recente estudo da Fundação Getúlio Vargas (FGV) demonstra que para cada R$ 1 investido no Carnaval, tem-se R$ 13 de retorno, refletidos em geração de renda, criação de empregos e estímulo ao consumo (arrecadação de impostos). Guardadas as devidas proporções em relação aos mega carnavais carioca, pernambucano ou soteropolitano, é de conhecimento de todos, até mesmo dos gestores públicos mais incompetentes, que o investimento no carnaval traz um retorno econômico de grandes dimensões. 

Obviamente, não é apenas o montante investido, mas sobretudo a maneira pela qual esse investimento ocorre - e como é pensado - que distingue a linha divisória entre um gestão pública descomprometida com os destinos da cidade e outro modelo de gestão, que ao entender a magnitude do Carnaval, cria uma espiral positiva de oportunidades econômicas, culturais e sociais. A gestão descomprometida é aquela que realiza formalmente o Carnaval, mas não faz a escolha pela cidade, em suas mais íntimas características. Por exemplo, gasta-se em Carnaval elevadas somas, mas não há a priorização dos grupos culturais da região, do mesmo modo não há abertura participativa na definição do destino dos recursos para ecoar a voz dos grupos oriundos da periferia: centraliza-se as decisões de investimento público numa elite governamental cega e surda aos caminhos do desenvolvimento e da cultura popular.  

Por outro lado, vale a pena imaginar o que seria uma gestão pública comprometida com o Carnaval, enquanto cultura popular e possibilidade de geração de renda, emprego. Nessa visão, fortalecer o carnaval, e, em geral, fortalecer a cultura popular da cidade significa preservar o trabalho de artistas, que dependem das festas populares para manter o sustento da família.  

Nesse modelo, a distribuição do investimento beneficia os grupos culturais locais (músicos, atores, produtores culturais, poetas, etc, artistas em geral), o comércio local (com ganho sobre empregos formais e arrecadação de impostos), os ambulantes locais (com ganho sobre a geração de renda para as classes pobres) e, ao fazê-lo, o poder público se beneficia na forma de aumentos de recolhimentos impostos, o que permite maiores investimentos na Cultura Popular: um círculo virtuoso de participação da periferia nos destinos da política pública cultural e de melhoria na qualidade de vida de todos os cidadãos.  

Neste modelo de gestão comprometida com o Carnaval, independente da região, o carnaval possui algo em comum em todas as suas manifestações: ele representa a cultura popular brasileira. Nesse sentido, a ocupação das ruas pelo povo marca uma resistência cultural muito importante, porque o Carnaval sempre foi uma festa popular e esse seu caráter faz com que, através dele, em cada região, o local ganhe voz e se reforce como identidade. Neste sentido, a linha divisória entre os dois modelos de gestão para o Carnaval fica tão mais claro quando se observa a concepção de Carnaval: a gestão descomprometida com o Carnaval, toma o samba e o Carnaval como tão somente um produto; por outro lado, a gestão comprometida, considera o samba e o Carnaval como expressões do povo mais marginalizado no Brasil.  

Portanto, trata-se de ir além da rasteira assíntota de “gostar ou não gostar” do Carnaval. O Carnaval tornou-se uma oportunidade única para o poder público melhorar as possibilidades de acesso à cultura e de desenvolvimento econômico local. Para tanto, é preciso abrir “a caixa-preta” das decisões sobre investimento, ampliar a participação deliberativa dos grupos representantes das classes marginalizadas e priorizar o crescimento econômico local, como forma sustentável e real do “Viver Bem” da cidade.  

É neste sentido, que o Carnaval, a festa mais popular e democrático do país - talvez do mundo! - subverte a apropriação que sofre das elites e torna-se opção para o desenvolvimento econômico e valorização da cultura das classes oprimidas de nosso país.  


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