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Solidariedade

Contra a fome e a Covid-19, quilombolas põem comida na mesa da favela

Cooperativa do Vale do Ribeira (SP) forma aliança para manter geração de renda nas comunidades e aliviar o impacto da pandemia em famílias vulneráveis

Publicado em 31/05/2021 às 08:31
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Mais internações, menos vagas de UTI, mais mortes por Covid-19. Dia 26 de fevereiro de 2021 e a Grande São Paulo regredia mais uma vez para a Fase Laranja do Plano SP, do governo estadual, que limita o funcionamento de serviços não essenciais. Era o início do mais grave período da pandemia até então.

Às 7h, o caminhão da Cooperativa dos Agricultores Quilombolas do Vale do Ribeira (Cooperquivale) encostava em frente à Associação de Moradores do Jardim São Remo, favela na zona oeste de São Paulo. E criava-se ali uma conexão das mais improváveis e urgentes: comida orgânica dos quilombos na periferia da maior cidade do país.

Caixas de palmito, caixas de banana, caixas de maná-cubiu, caixas de abacate, caixas de limão cravo, caixas de jaca mole, caixas de mel, levas de peixe seco, levas de banana chips, caixas de rapadura, caixas de abóbora, caixas de batata doce (com 3 variedades) e caixas de mandioca e mais caixas foram passadas de mão em mão.

O papo no grupo de mulheres voluntárias da associação de moradores era adivinhar quais eram as novidades da roça dos quilombolas, tamanha a diversidade de produtos. “Esse aí teve gente que achava que era caqui. Mas é azedo, é o tal do cubiu”, e gargalhavam. “E isso aqui é batata doce ou mandioquinha? É da branca, da vermelha, vem de tudo quanto é jeito…”, diziam, enquanto as caixas deslizavam de um lado para o outro, fazendo labirinto no meio do salão.

Ao todo, eram 11 toneladas de alimentos quilombolas que, segundo os voluntários da associação, devem ajudar a alimentar cerca de mil famílias no mês. Ainda é pouco.

Pesquisa realizada em fevereiro pelo Instituto Data Favela em parceria com a Locomotiva — Pesquisa e Estratégia e a Central Única das Favelas (Cufa) mostra um cenário alarmante. Oito em cada dez moradores de favelas disseram precisar de doações para sobreviver.

“Hoje, infelizmente, depois que o pessoal voltou a trabalhar, houve essa falsa impressão de que a pandemia acabou. Mas não acabou”, disse Catarina Godói, cozinheira e voluntária da associação de moradores. “A quantidade de lojas fechadas, postos de trabalho fechados, é enorme. Gritante. Hoje as pessoas estão precisando muito mais do que no início, quando ocorreu aquele choque”, afirmou.

Maria da Conceição Mendes dos Santos Oliveira, 64 anos, grupo de risco para Covid-19, com dificuldades para caminhar e carregar peso, não poderia buscar a comida na sede da associação. Mas recebeu na porta de casa, entrega feita por seu sobrinho Lula Santos, professor e liderança comunitária.

“Um tempo atrás eu falei para o meu sobrinho dar uma olhada na geladeira. Aí ele olhou. Sabe o que eu tinha? Água. Só água. Eu não consigo comprar. A banana, por exemplo, é muito importante. Tem cálcio, potássio, é importante…”, afirmou. “Abóbora, banana, é coisa que só faz muito bem. Tudo que vem é bem-vindo. Tudo é muito importante para nossa saúde. Abençoadas sejam essas pessoas que nos ajudam.”

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